A fim de produzir a necessária MASSA ATOMIZADA E
AMORFA, precisava primeiro liquidar o resto de poder dos Sovietes. Por
volta de 1930, os últimos vestígios das antigas instituições comunais
haviam desaparecido.
O
governo bolchevista empreendeu então a liquidação das classes e
começou, por motivos ideológicos e de propaganda, com as classes
proprietárias, a nova classe média das cidades e os camponeses do
interior, cuja liquidação foi mais meticulosa e cruel que a de qualquer
outro grupo, e foi levada a cabo por meio de fome artificial e
deportação, a pretexto de expropriação dos kulaks e de coletivização. A
liquidação das classes média e camponesa terminou no início da década de
30: os que não se incluíam entre os muitos milhões de mortos ou milhões
de deportados sabiam agora “quem mandava neste país” e haviam
compreendido que as suas vidas e as vidas de suas famílias não dependiam
dos seus concidadãos, mas somente dos caprichos do governo, aos quais
tinham de enfrentar em completa solidão. Não há classe que não possa ser
extinta quando se mata um número suficientemente grande de seus membros.
A próxima classe a ser liquidada como grupo era a dos operários. Como
classe, ofereciam muito menor resistência que os camponeses, porque a
expropriação dos donos de fábricas, que eles haviam realizado
espontaneamente durante a Revolução, havia sido imediatamente frustrada
pelo governo, que confiscara as fábricas como sendo propriedade do
Estado, sob o pretexto de que o Estado pertencia ao proletariado. O
sistema stakhanovista, adotado no início da década de 30, eliminou a
solidariedade e a consciência de classe dos trabalhadores pela
concorrência feroz implantada pela solidificação de uma aristocracia
operária, separada do trabalhador comum por uma distância social mais
aguda que a distância entre os trabalhadores e a gerência. Esse processo
foi completado em 1938, quando a criação do documento de trabalho
transformou oficialmente toda a classe operária russa num gigantesco
corpo de trabalhadores forçados.
Finalmente,
veio a liquidação daquela burocracia que havia ajudado a executar as
medidas anteriores de extermínio. Stálin levou dois anos, de 1936 a
1938, para se desfazer de toda a aristocracia administrativa e militar
da sociedade soviética; quase todas as repartições públicas, fábricas,
entidades econômicas e culturais e agências governamentais, partidárias e
militares passaram a novas mãos, quando “quase a metade do pessoal
administrativo havia sido eliminada”, e foram liquidados mais de 50% de
todos os membros do partido e “pelo menos outros 8 milhões de pessoas”.
E, como esse expurgo geral terminou com a liquidação das mais altas
autoridades policiais — as mesmas que antes haviam organizado o expurgo
geral —, nem mesmo os oficiais da GPU, que haviam instaurado o terror,
podiam pensar que, como grupo, ainda representassem alguma coisa.
DESFAZER TODOS OS LAÇOS
Desde os tempos antigos, a imposição da igualdade de condições aos
governados constituiu um dos principais alvos dos despotismos e das
tiranias, mas essa equalização não basta para o governo totalitário,
porque deixa ainda intactos certos laços não políticos entre os
subjugados, tais como LAÇOS DE FAMÍLIA e de interesses culturais comuns.
O totalitarismo deve chegar ao ponto em que tem de acabar com a
existência autônoma de qualquer atividade que seja, mesmo que se trate
de xadrez. Os amantes do “xadrez por amor ao xadrez”, adequadamente
comparados por seu exterminador aos amantes da “arte por amor à arte”,
demonstram que ainda não foram absolutamente atomizados todos os
elementos da sociedade, cuja UNIFORMIDADE INTEIRAMENTE HOMOGÊNEA É
CONDIÇÃO FUNDAMENTAL PARA O TOTALITARISMO.
A atomização da massa na sociedade soviética foi conseguida pelo uso
de repetidos expurgos que invariavelmente precediam o verdadeiro
extermínio de um grupo. A fim de destruir todas as conexões sociais e
familiares, os expurgos eram conduzidos de modo a ameaçarem com o mesmo
destino o acusado e todas as suas relações, desde meros conhecidos até
os parentes e amigos íntimos. A “culpa por associação” é uma invenção
engenhosa e simples; logo que um homem é acusado, os seus antigos amigos
se transformam nos mais amargos inimigos: para salvar a própria pele,
prestam informações e acorrem com denúncias que “corroboram” provas
inexistentes. Em seguida, tentam provar que a sua amizade com o acusado
nada mais era que um meio de espioná-lo e delatá-lo como sabotador,
trotskista, espião estrangeiro ou fascista. Uma vez que o mérito é
“julgado pelo número de denúncias apresentadas contra os camaradas”, é
óbvio que a mais elementar cautela exige que se evitem todos os contatos
íntimos com aqueles que sejam obrigados, pelo perigo da própria vida, à
necessidade de arruinar a de outrem. Em última análise, foi através do
desenvolvimento desse artifício, até os seus máximos e mais fantásticos
extremos, que os governantes bolchevistas conseguiram criar uma
sociedade atomizada e individualizada como nunca se viu antes, e a qual
nenhum evento ou catástrofe poderiam por si só ter suscitado.
Os movimentos totalitários são organizações maciças de indivíduos
atomizados e isolados. Distinguem-se dos outros partidos e movimentos
pela exigência de lealdade total, irrestrita, incondicional e
inalterável de cada membro individual. Essa exigência é feita pelos
líderes dos movimentos totalitários mesmo antes de tomarem o poder e
decorre da alegação, já contida em sua ideologia, de que a organização
abrangerá, no devido tempo, toda a raça humana. Contudo, onde o governo
totalitário não é preparado por um movimento totalitário (como foi o
caso da Rússia em contraposição com a Alemanha nazista), o movimento tem
de ser organizado depois, e as condições para o seu crescimento têm de
ser artificialmente criadas de modo a possibilitar a lealdade total que é
a base psicológica do domínio total. Não se pode esperar essa lealdade a
não ser de seres humanos completamente isolados que, desprovidos de
outros laços sociais — de família, amizade, camaradagem — só adquirem o
sentido de terem lugar neste mundo quando participam de um movimento,
pertencem ao partido.
A lealdade total só é
possível quando a fidelidade é esvaziada de todo o seu conteúdo
concreto, que poderia dar azo a mudanças de opinião. Os movimentos
totalitários, cada um ao seu modo, fizeram o possível para se livrarem
de programas que especificas sem um conteúdo concreto, herdados de
estágios anteriores e não totalitários da sua evolução. Por mais radical
que seja, todo objetivo político que não inclua o domínio mundial, todo
programa político definido que trate de assuntos específicos em vez de
referir-se a “questões ideológicas que serão importantes durante
séculos” é um entrave para o totalitarismo.
O verdadeiro objetivo do fascismo era apenas a tomada do poder e a
instalação da “elite” fascista no governo. Já o totalitarismo jamais se
contenta em governar por meios externos, ou seja, através do Estado e de
uma máquina de violência; graças à sua ideologia peculiar e ao papel
dessa ideologia no aparelho de coação, o totalitarismo descobriu um meio
de subjugar e aterrorizar os seres humanos internamente.
Referência: Hannah Arendt, "Origens do Totalitarismo" pgs 287-291
*
COTAS DE PRISÕES PARA MANTER O POVO ATERRORIZADO
"As
prisões políticas em nosso país singularizaram-se durante décadas
precisamente pelo fato de serem detidas pessoas em nada culpadas e, por
isso mesmo, de modo nenhum preparadas para oferecer resistência.
Criou-se o sentimento geral da fatalidade, a idéia de que era impossível fugir..."
(...)
"Os
"Órgãos" não tinham frequentemente motivo profundo para a escolha, não
sabendo que pessoa deter ou não deter, mas simplesmente QUAIS OS NÚMEROS
A ATINGIR. O cumprimento desses números podia estar de acordo com as
normas, mas podia também ter um caráter completamente casual. Em 1937
apareceu na recepção da NKVD de Novotcherkassk uma mulher perguntando
que destino devia dar a uma criança de peito que tinha fome, de uma
vizinha detida.
"Sente-se", disseram-lhe, "vamos esclarecer isso."
Esperou duas horas e levaram-na da recepção à cela: era preciso
completar urgentemente a cota prevista e faltavam agentes para mandá-los
percorrer a cidade, e aquela mulher já estava ali mesmo!"
*
O PADRÃO TOTALITÁRIO
https://conspiratio3.blogspot.com/2020/07/o-padrao-totalitario-hannah-arendt-e.html
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O CRIME DE TER VIDA PRIVADA - ORLANDO FIGES - SUSSURROS "Na visão utópica deles, o ativista revolucionário era um protótipo de uma nova espécie de ser humano, uma "personalidade coletiva"
que viveria apenas pelo bem comum, que popularia o futuro da sociedade
comunista. Muitos socialistas viam a criação desse tipo de ser humano
como o objetivo fundamental da Revolução.
Para os bolcheviques, a
realização radical da "personalidade coletiva" exigia "romper a concha
que envolve a vida privada". A permissão para que houvesse uma
"distinção entre vida privada e vida pública levará, mais cedo ou mais
tarde, à traição do comunismo", defendia Nadezhda Krupskaia, a mulher de
Lenin. Segundo os bolcheviques, a idéia de uma "vida privada" separada
do âmbito da política não fazia sentido, pois a política afetava tudo;
não havia nada na suposta "vida privada" de uma pessoa, que não fosse
política. A esfera pessoal devia, portanto, estar submetida à supervisão
e ao controle público. Espaços privados além do controle do Estado
foram considerados pelos bolcheviques como perigosas áreas de reprodução
de contrarrevolucionários que precisavam ser expostos e extirpados." https://conspiratio3.blogspot.com/2023/05/o-crime-de-ter-vida-privada-orlando.html
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TÉCNICA TOTALITÁRIA DA FALSIFICAÇÃO DO BEM, DO MAL E DA CULPA - EXCLUSÃO/CANCELAMENTO/EXPURGO/EXTERMÍNIO - ÓDIO DIRIGIDO https://conspiratio3.blogspot.com/p/antiga-tecnica-totalitaria-da.html
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SAUL ALINSK, O DEMÔNIO VIVEU ENTRE NÓS
https://youtu.be/0X9qyHX8x_c
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A PROIBIÇÃO DE PERGUNTAR - Por linguagem ideológica, refiro-me ao fenômeno diagnosticado por Eric Voegelin em uma fração considerável do pensamento político moderno e que marcaria um ineditismo em relação à antiguidade clássica: a "PROIBIÇÃO DE PERGUNTAR". Não se trata aí, diz Voegelin, de uma simples resistência à análise, coisa que, decerto, também existia no passado. Não estamos falando apenas de um apego passional a opiniões (doxai) em face de uma análise (episteme) que as contrarie. Como esclarece o filósofo alemão: "Em vez disso, confrontamos-nos aqui com pessoas que sabem que, e por que, suas opiniões não podem resistir a uma análise crítica, e que, portanto, fazem da proibição do exame de suas premissas parte do seu dogma." (Eric Voegelin). Essa linguagem ideológica, sustentada sobre a proibição de perguntar, é um dos traços mais característicos do ambiente intelectual marxista e esquerdista de modo geral. (...) Gramsci foi, inegavelmente, um dos mais hábeis técnicos em linguagem ideológica. (FLÁVIO GORDON - A CORRUPÇÃO DA INTELIGÊNCIA)
Flávio Gordon - "Se, durante a ditadura, tínhamos uma censura autoritária e visível (frequentemente burlada, como muitos artistas e jornalistas da época já cansaram de confessar, até com certa graça), hoje temos uma censura totalitária, invisível, grave, onipresente. Ela não comporta gracejos nem brechas. Se, antes, ela vinha exclusivamente do governo, hoje ela é mais de tipo soviético-chinês, e o censor pode estar ao lado."http://obrasileouniverso.blogspot.com/2013/11/censura.html
Como a direita conservadora, que recentemente, graças sobretudo à internet, teve acesso ao pensamento conservador, censurado velada e abertamente nas faculdades de Humanas do Brasil, e percebeu que conservadorismo não tem nada a ver com o que a esquerda diz que o conservadorismo é (natürlich), a incipiente direita brasileira lembrou ao mundo que o nacional-socialismo é uma forma de socialismo (…!), e não de conservadorismo ou capitalismo.
O nazismo, que sempre se apresentou como uma terceira via, pega elementos do socialismo (sobretudo as antigas teses germânicas sobre socialismo), do trabalhismo e do sindicalismo político.
O sindicalismo, aliado ao islamismo, já havia realizado o primeiro genocídio da história a superar 1 milhão de mortos: o grupo Jovens Turcos (Jön Türkler), que se opunha à monarquia do Abdülhamid II no Império Otomano (atual Turquia), buscando uma homogeneização cultural com laços com a Revolução Russa, promoveu o genocídio de cristãos armênios em 1915, durante a Primeira Guerra. A Armênia foi, provavelmente, o primeiro lugar do mundo a se converter ao cristianismo.
Mais em: Resposta ao textículo do militante do PSOL no blog do Guga Chacra sobre “nazismo ser de direita” https://sensoincomum.org/2017/08/17/resposta-guga-chacra-nazismo-direita/
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